Ana Luzia Oliveira

O Mundo Devora Quem Devora o Mundo (?)

Às vezes me sinto uma zebra devorada por um mundo guepardo
Que ronda, encurrala e caça suas vítimas,
sem chance de sobrevivência.
Mas o mundo guepardo não o faz por crueldade,
embora seja tensa a cena da caçada.
Há que se admitir as poucas chances de uma zebra
diante de um mundo guepardo faminto.

Às vezes me sinto grande e forte como uma cabeça de gado.
Só que desgarro fácil do rebanho
e, de tão confiante no meu imenso tamanho
esqueço dos riscos sorrateiros e traiçoeiros.
Quando me dou conta, estou enroscada por um mundo sucuri
que me quebra os ossos devagar até conseguir me engolir
e me digere lenta e preguiçosamente
mostrando-me que a ostentação de nada me valeu
sem a percepção do chão onde pisei

Às vezes sou cruelmente degustada pelo mundo humano
Que me alimenta e me engorda até me adoecer
para me transformar em iguaria, fois gras, caro, refinado
às custas de um fígado de um eu ganso
incapaz de metabolizar o excesso de gordura
com que me entopem todos os dias, por egoísta satisfação. 

Mas não me tomem sempre como a vítima indefesa
Também posso ser a onça que caça
A águia que segura a presa em suas garras
Ou a Eva que devora saboreando, mordida a mordida,
a sua suculenta maçã.