Sara Melo

Em Hora de Crise


eu sinto o frio sob os pés: ressoa aqui dentro em hora de crise

as risadas ecoam no ar: são respiros que arranham demais a garganta

não toca; que o peito arde gelado

e o coração não conhece o limite do próprio bater.

Já o tempo excrucia em hora de crise: pisa largo, sem razão

as palavras já fogem ao controle, sem receio a proteger

e o amanhã parece que não vem.

então não toca;  mas não deixa; não fica;  mas não vá

eu juro: é só água morna na cabeça

é só silêncio, que então 

dói cada vez menos

e eu consigo velejar

mas tira a luz, que queima as pálpebras

tira a gola que enforca

por favor, não bate a porta

que sou de um mundo que escorre

feito água em outros braços

mas me enterra a sete palmos e me cala

e se todo dia eu me acordo

é pelo cheiro de gás livre

que a rua entorna

mas eu insisto em respirar

eu insisto.