Não exija que o poeta
cumpra função de bodoque -
não conclame, não evoque.
Não romantize o bulício.
Pra que a vitrine
da loja de grife
espatife
é preciso que se borrife
uma bátega acertada:
sob pilha de pedriscos
a montra logo estilhaça
em violento chuvisco.
Bote a própria mão na massa
pra organizar o motim.
No momento do levante,
esqueça que o poeta existe -
entenda, tintim por tintim.
Rima pode ser pedrada,
talhada na alegoria.
Mas, na hora da porfia,
ao revidar ameaças,
versos não quebram vidraças,
de nada serve a poesia.
Poesia Não Serve Pra Nada revela a vontade de Tiago Reivax de passar alguns dias fechado em casa, ouvindo música no sofá com a TV ligada no mudo, apontando a desgraceira até a alma afoita sair pelo nariz e pela boca e passear pelos cômodos, assim, como quem não quer servir pra nada só por vingança a ter que ser sempre útil. Desamparada, atônita, regada a charros e cerveja ruim, Poesia Não Serve Pra Nada precede de uma inconveniência necessária a apontar o caos programado desse começo trágico de século e, seja no humor ou na raiva, não tem como dispor da indiferença de nenhum leitor.
Coloco aqui minha cara à tapa
num autorretrato em branco e preto
propositalmente tratado
iluminado meio de lado
pra avisar, apressado
com muito carinho e cuidado
que na sua estante
às muitas leituras concluídas
e a uma ou outra procrastinada
logo poderá incluir
a modesta obra intitulada
Poesia Não Serve Pra Nada.