De onde vem essas tuas riquezas, moço?
Essas terras são suas?
Quem te deu a permissão para pisar nesse chão?
Que direito você tem de invadir terras e roubar riquezas?
Tu achas que pode retirar pessoas de suas terras para serem exploradas por ti?
Covarde!
Invasor!
Não te aceito nesse chão!
Não permito que invada meu corpo
E com suas mentiras perfurar minha identidade.
Nessas tuas mãos escorrem sangue de gente que tu e teu povo não conseguiram matar: com sua ambição, com teu mal cheiro, teus vírus e genocídios!
Tu tá mal-acostumado, moço...
Sempre querendo empurrar o silêncio em nossas bocas,
Nos condenar em nossas próprias terras,
E exterminar os donos para conquistar matando o nosso povo.
Por isso, pra defender meu povo,
Sou chuva que derruba árvore e inunda rio
Em outros renasço em rio, deságua em chuva e trovoada.
Sou pé de vento que move as copas das matas e das casas de taipa
Tapada por mãos originarias, com barro da terra que nos pariu.
Repartida por mãos brancas,
Roubadas na invasão:
Ação de senhores-capitães
Apontam sobre nossos peitos armas e canhões,
Nos obrigam a usar máscaras do esquecimento,
Mas nós reexistimos, plantamos e decolonizamos a terra que eles invadem.
Com enxada, flexa e biscô, abrimos estradas, caminhamos a passos firmes,
Sambando, pisando e pintando de urucum a terra que faz nossa morada.
Mas de quem é essa terra, moço?
Me diga, de quem é essa terra, moço?
Para que eu te responda, daqui para a frente não precisa mover uma agulha,
Nenhum grão dessa terra maltratada.
Não levantarei minha voz,
Colocarei o facão na bainha,
Também não serei ventania e nem temporal.
Sabe de quem é essa terra, moço?
Sabe de quem é essa terra, moço?
Essa terra minha gente,
É de quem cultiva no cassengue,
Faça chuva ou faça sol.
Essa terra é da gente!
E se você não compreende
Vou ter que organizar minha gente,
Pois não estamos contentes com o roubo feito por vocês.
De quem é essa terra, minha gente?
É da gente, Guerém!!
*
Minha ancestralidade corre nas águas,
brota da terra
E percorre o sangue do meu povo.
Sou filho Guerém!
Parido do corpo de Maria:
Mulher das folhas e do roçado,
É dela que herdei a fúria, a luta,
O desejo e o sonho de ver os nossos existindo nesse chão.
No chão que piso
Recorro às folhas, banhos e rezadeiras,
Mergulho em águas cachoeiras,
Me fortaleço nos rios Piau, Una e Jerebinha.
Me banho nas Pedras das Moças,
Brinco de ser uma
Nado junto a Janaina.
Me refúgio nas Matas Jueranas:
Respiro o seu ar
Balanço, giro, canto e cultuo minhas encantadas:
Ofereço-lhe flores, frutos e poesias.
Sigo chamando ao meu lado
Janaina, Jurema e Jueranas,
Não ando só!
Quem orienta meu Ori é a mesma voz que trouxe Mãinha até aqui,
E é essa voz que grita a liberdade desse povo:
Indígena como eu!