Angel Cabeza

Trezentos metros


Os anúncios de imóveis

nos garantem que a felicidade é de concreto.

Pesa trezentos metros de luxuoso gris.

Tudo tão alinhado no alto dos edifícios

que todos parecem repousar à direita de deus

pai todo poderoso.

As pequenas criaturas embaixo sonham

suas caixas de madeira, suas carteiras de trabalho,

o troco para o pão.

Mas os anúncios acreditam que a felicidade

é uma janela aberta na altura dos pássaros.

Esse engano nunca me pareceu tão caro.

É por isso que carrego por dentro uma pátria que me basta;

descanso meus olhos na dureza das vigas;

abraço o chão e sua poeira, pois é nele que reside o assombro.

Nascemos e morremos nus, sem vestes de ferro.

Nos altos edifícios as felicidades sempre envasadas no âmbar:

pequenas doses, grandes submundos.

Fios, pássaros, postes, árvores:

a cidade real dorme e cresce naquilo que afunda.

Lá no alto, tão perto do céu,

os felizes observam tudo

em gaiolas de LED e mudez.