Poetas do Paraná

Adriano Salvi | Canção do Exílio Revisitada


Minha terra tem saúvas

que os males do Brasil são.

Nosso céu anda encoberto

dada tanta poluição, 

queimadas e devastação

nossas flores já murcharam

foi o amor que desertou.


Em cismar, sozinho, à noite,

que prazer encontro eu cá?

Quem me dera eu ter asas

e voar feito sabiá.


Não permita Deus que eu morra

de desgosto ou indignação.

Ao ver o Estado brasileiro

tão distante da nação.



Cris Otto Sa | Chora A Cabocla


As lágrimas escorrem pelo seu rosto e caem na terra seca. 

Como quem teme pelo futuro, segura forte na mão de sua filha 

que com o olhar entristecido 

não acredita na paisagem desoladora à sua frente. 

O que terá acontecido com os animais que perambulavam no seu entorno? 

A diversidade trocada por um rastro vermelho acinzentado 

de destruição e morte, seguido talvez por uma monocultura 

que beneficiará à poucos. E a boiada passará.

Por quê?  Silêncio.

O único barulho é o do estalar do tronco da árvore ainda em brasas. 

Para muitos apenas um pé de pau queimando. 

Reservas indígenas agredidas, violentadas. 

Longe dali corações desumanizados 

e bocas que cospem palavras acovardadas, 

colocam a culpa em quem cuida e ama as florestas 

e fragilizam às Instituições responsáveis pela demarcação e proteção. 

Entre a ganância e a ignorância de uma gente 

que nunca entendeu ser parte da natureza 

carregam o ódio da destruição e permitem ou aceitam 

os ataques com suas ações ou omissões. 

Esquecem-se que antes que a Casa Mãe sucumba, 

sucumbimos todos nós. 

E a cabocla que segura na mão de sua filha e chora por ela, 

por sua filha e pelos nossos filhos e nossas filhas.


David Ehrlich | Cavalo


O cavalo branco corre

Por colinas verdes,

Um longo caminho percorre

Feliz e contente:

“Isto aqui é o mundo”,

Pensa em sua ingenuidade.

“Só mato, flor e céu azul,

Pasto infinito cheio de bondade!”

Corre tão longe, porém,

Que o pasto acaba,

E à sua frente, mais além,

O verde ao cinza desaba.


Toda planta desmatada,

Todo rio secado,

A terra à exaustão escavada

E cheia de lixo.

A paisagem cinza

Logo acinzenta seu pelo

E também seus pensamentos:

“Se este é o mundo, não quero mais vê-lo”.

Mas ao correr para trás

Não vê mais pasto:

Aquele cinza voraz

Foi mais rápido e nefasto

Francielle Manini | Cédulas


Árvores virando papel

Retrato fiel do nosso caos

Porque o valor ordinário

Do oxigênio

Está no bolso

- isento de imposto -

do empresário

Guilherme Brante | Perspectiva 1


hoje vi um pássaro:


Passeando nas pedras

batendo nas pedras      no passeio

Por quê?


Pode ser que seus pensamentos     de pássaro

tenham capturado a presa minhoca debaixo da própria calçada

ou pode ser porém que estivesse pura a sua preocupação

Angustiado com a semente plantada debaixo das pedras

sem espaço de ser

ou talvez seja dele o pensamento que voou até os campos verdes plantados         em memória 

E despedaçou contra a parede invisível, tipo vidro:

Cansado

Saudoso

Adiado

E

Hoje vi  um pássaro


Passeando nas pedras

batendo nas pedras         do passeio

Por quê?


Pode ser que seus pensamentos      de pássaro

tenham capturado a presa minhoca debaixo da própria calçada

ou pode ser porém que estivesse pura a sua preocupação

Angustiado com a semente plantada debaixo das pedras

sem espaço de ser

ou talvez seja dele o pensamento que voou até os campos verdes plantados         na memória 

E despedaçou contra a parede invisível, tipo vidro:

Cansado

Saudoso

Adiado

E talvez por isso o pássaro se foi contra a pedra se foi contra se foi contra se foi contra se foi se e

Hoje vi um pássaro e

Hoje



Jeane Imthon | Pantanal


No início era AR

no horizonte SOL

livre-voar vida-germinar


Socozinhos

  Garças

Tuiuiús

Carcarás


Era VIDA de pescar

nos corixos inundados

passarinhar filhote-alimentar


Mas dum lampejo labaredas

do vento         cinzas

do crepitar da mata palha

da vida         lamentos

MORTE


Asas chamuscadas

a agonizar

revoada incerta preso-voar


Tudo era FOGO

Nada era AR 


Joema Carvalho | Peruaçu


montanha pré-histórica 

rochas góticas pontiagudas

o sagrado não precisa de templo

puro gênese

cada cor uma marca do tempo

a dança das mudanças climáticas


quanto maior a concentração de carbono

menor diversidade de vida

assim se fez no princípio

assim tende o nosso retorno, trilobita

em camadas densas refletidas por minerais


no meio de lixo, nossa carcaça sedimentada em camadas

por compressão e pressão de nossa essência


águas verdes cristalinas 

refletem nossa sombra translúcida

entre rochas testemunhas


não escapamos de nossas ações

de passagem, chegamos

pós galácticos buscando poesia



Ray Lee | SUSTENT(AR)


A gente recicla, reutiliza e reduz,

Mas o agronegócio consome mais da metade da água potável disponível.

A gente reutiliza, reduz e recicla,

Mas o agronegócio invade as terras e aldeias indígenas.

A gente reduz, recicla e reutiliza,

Mas o agronegócio destrói as matas e florestas, com a permissão do governo.


O agronegócio sustenta a vida dos brasileiros (é o que diz na tevê),

Acabando com tudo que vê pela frente, sem medir consequências,

Enquanto quem, realmente, luta para salvar o mundo,

É silenciosamente silenciado.

(Isso, ninguém vê). 

Aí, a gente recicla, reutiliza e reduz,

E até se reeduca, 

Para tentar diminuir os estragos.

E, no fim das contas,

Não adianta absolutamente nada.